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31 maio 2012

Os Lusíadas

Relativamente às dúvidas suscitadas e pedidos feitos, volto a publicar as informações de síntese da matéria, incluídas nos nossos PPT usados no 1º período.

Mas atenção: mais do que andar a repetir publicações, é preciso é estudar, rever, treinar!
A epopeia tem, por natureza, um carácter eufórico e de exaltação das façanhas do herói (individual e colectivo, no caso d’Os Lusíadas).
No entanto, Camões – com lucidez e espírito crítico – revela o seu desencanto frente a uma pátria “mergulhada numa austera, apagada e vil tristeza”, intervindo criticamente e/ou didacticamente, sobretudo no final dos cantos.   
  
CAMÕES FAZ REFLEXÕES CRÍTICAS / ADVERTÊNCIAS dirigidas a:
Ø Canto I – Insegurança e fragilidade da vida: “(…)Onde terá segura a curta vida/Que não se arme e indigne o Céu sereno/Contra um bicho da terra tão pequeno?” (C.1, 106)
Ø Canto IV – Ambição e ousadia dos navegantes e suas previsíveis consequências nefastas, a exemplo de Adão, Prometeu, Ícaro; a evidência deste arrojo como próprio da “humana geração”, essa “estranha condição”. (IV, 104)

Ø Canto V – Falta de interesse pelas Artes e as Letras: “(…) não se ver prezado o verso e a rima/ Porque quem não sabe arte, não na estima.” (V, 87); o mesmo motivo será repetido nos Cs. VII e X.
o  Adverte para que os heróis devem às Musas a sua fama, ou seja: o verso/a rima são necessários à imortalização dos heróis: “ Às Musas agradeça o nosso Gama/O muito amor da pátria, que as obriga/A dar aos seus, na lira, nome e fama”
Ø Canto VI – Censura da inacção, do luxo; crítica aos que dormem à sombra dos antepassados, aos que se acomodam;
·     Advertência de que a honra só se alcança com virtude e acção. Necessidade de “árduo sofrimento”, de “trabalhos graves e temores”, do buscar com “seu forçoso braço” a “fama” e as “honra imortais e graus maiores”; (VI, 95-97)
Ø Canto VII – Ingratidão da pátria perante o seu mérito; Camões – “Numa mão sempre a espada e noutra a pena” – lastima a falta de “prémio” (reconhecimento) por parte “daqueles que (…) cantando andava”;
Ø Canto VIII – Poder corruptor do dinheiro; este “faz traidores e falsos os amigos”, “A mais nobres faz fazer vilezas”, “Os juízos cegando e as consciências”, “faz e desfaz leis”; o dinheiro “corrompe” e “ilude”; (VIII, 96-99)

Ø Canto IX – Censura das “honras vãs” -  cobiça, avareza e tirania infame – que “verdadeiro valor não dão à gente” por oposição às “riquezas merecidas” [leis justas; feitos de armas]; (IX, 92-94)
·Advertência de que o ócio transforma o livre em escravo: “Se quiserdes no mundo ser tamanhos, / Despertai já do sono do ócio ignavo [indolente], / Que o ânimo, de livre, faz escravo.”
Ø     Canto X – Cansaço de cantar “a gente surda e endurecida”; Crítica à cobiça, avareza e tristeza moral da pátria: “metida no gosto da cobiça (…) apagada e vil tristeza”

MENSAGEM

Ø   É publicada num momento que o poeta considera triste, de falta de arrojo criador, de crise de identidade nacional

Ø   Conjuga características da épica e da lírica:

§    Épica: matéria histórica/glorificação dos heróis
§    Lírica: expressão da subjectividade do “eu”; “sonho de um sonho”; leitura interpretativa e pessoal 
Ø    Tem um carácter:

o   Profético

Ø A profecia do V Império, com dimensão espiritual;

Ø A presença de um sebastianismo renovador;

Ø D. Sebastião como figura tutelar e inspiradora


o  Simbólico e mítico – valorização duma leitura mítica da História de Portugal, carregada de simbologia:


Ø Sinais, avisos, sagrações…
Ø Elementos da mitologia, da heráldica, das sociedades secretas

o  Esotérico

Ø  O poeta surge como: mediador, voz, profeta: estabelece a ligação entre Deus e os homens, na revelação dos mistérios divinos de Portugal.


Ø O poeta, tal como a pátria, tem uma missão sagrada.

Ø             O            O herói (arquétipo do português)  é:

·      Consagrado a uma missão

·     Agente de uma vontade transcendente e divina
·     Capaz de estar à altura, de ler os sinais e agir em conformidade:


Ø  Sente-se impelido/ é chamado


Ø  Planeia/ sonha


Ø  Age


·     As figuras históricas que desfilam na Mensagem valem pelo ideal que representam: valentia, arrojo, previsão, fé, «loucura», sentido de missão…


Ø Visão sacrificial e empreendedora da heroicidade: “Quem quer passar além do Bojador/Tem de passar além da dor”; “Valeu a pena? /Tudo vale a pena/Se a alma não é pequena.”, “O esforço é grande, o homem é pequeno”

28 maio 2012

Memorial - adaptação teatral



Para quem não foi à visita a Mafra - oportunidade para ver um pouco da peça.

Para quem foi - para recordar.

Tem:
2 filmes
música original
síntese do espetáculo e comentários

07 maio 2012

A História e a identidade portuguesa



Aqui fica um texto que vos servirá simultaneamente para compreender melhor a identidade literária de José Saramago e a sua projeção internacional, bem como exemplo de um texto expositivo devidamente estruturado.



Imagem do cenário da opera Blimunda

O Mundo Literário de José Saramago Kim Yong-Jae Departamento de Português da Universidade de Pusan, Coreia do Sul
Esforço em fazer  reviver a História e identidade portuguesa  através de uma nova linguagem 

O Mundo Literário de José Saramago é constituído por quatro elementos fundamentais: Primeiro, a dúvida do homem moderno numa dupla lógica de assumir uma posição crítica sobre o passado e, ao mesmo tempo, aprender com o passado. Segundo, a introdução dos elementos sobrenaturais, ou seja, fantásticos, não se distanciando, no entanto, do mundo real. Terceiro, a tentativa de uma nova linguagem que altera a sua expressão gráfica e pontual, respeitando a sintaxe da narrativa comum. Por último, a viagem não só no mundo real, mas também no interior do Homem através da imaginação. Com estes elementos de 'tempo', 'sobrenatural', 'torrencialidade da narrativa' e 'a viagem' que se interpenetram as suas obras procuraram a utopia através de alusões alegóricas, críticas e éticas.

Assim, Saramago tem vindo a tentar, nas obras publicadas desde "Levantado do Chão", a harmonia entre a realidade e a imaginação através de trabalhos que pretendem unir numa só empreitada os planos expressivos da fala, do pensamento e da escrita. (...)


Na realidade, utiliza só vírgula e ponto final, não distinguindo discursos directos e indirectos, de modo que os seus romances têm de ser lidos diferentemente dos outros romances. Isto significa que o texto exige uma atenção especial aos leitores, dando-lhes a impressão de estarem envolvidos directamente no mundo real e, ao mesmo tempo, fictício, ambos construídos nas suas obras.

Para além do elaborado trabalho de linguagem, Saramago aborda profundamente os problemas de Portugal contemporâneo e da identidade do povo lusitano. Além de apresentar o rumo que Portugal deverá seguir e a sua visão do mundo, Saramago procura a identidade do homem perdida na sociedade moderna. Talvez através do seu estilo torrencial, que às vezes o toma difícil de ler, esteja a procurar a identidade de Portugal após a sua adesão à União Europeia.


Concluindo, a grandeza das obras de Saramago reside no esforço de evocar a História e a identidade da 'pátria perdida', juntamente com a procura de uma nova linguagem literária em que se afirma o seu espírito experimental.
Publicado na Camões, Revista de Letra e Culturas Lusófonas, Número 3· Outubro-Dezembro de 1998, disponível no sítio do Instituto Camões, URL: http://www.instituto-camoes.pt/revista/mundliterjs.htm, acedido em 7 d emaio de 2012.



De realçar que a obra de J. Saramago está traduzida em 42 línguas, nos seguintes países:

Albânia, Alemanha, Argentina, Áustria, Bangladesh, Bósnia-Herzegovina, Brasil, Bulgária, Canadá, China (em Mandarim e em Cantonês), Colômbia, Coreia do Sul, Croácia, Cuba, Dinamarca, Emiratos Árabes Unidos, Eslováquia, Eslovénia, Espanha (em Castelhano, Catalão, Valenciano e Euskara), Estados Unidos da América, Estónia, Finlândia, França, Grécia, Guatemala, Hungria, Índia (em Índi, Malayam e Bengali), Irão (em Farsi), Iraque, Islândia, Israel, Itália (em Italiano e Sardo), Japão, Letónia, Lituânia, Macedónia, México, Montenegro, Noruega, Países Baixos, Perú, Polónia, Reino Unido, República Checa (em Checo e Eslovaco), República Dominicana, Roménia, Rússia, Sérvia, Síria, Suécia, Suíça, Tailândia, Taiwan, Turquia, Uruguai. 

Imagens (3): Noémia Santos - Exposição "José Saramago: a consistência dos sonhos", sobre Vida e Obra de José Saramago, no Palácio da Ajuda.


03 maio 2012

Pragmática - Coesão textual

A pedido de vários alunos, relembra-se alguns elementos essenciais relativos à pragmática textual, isto é, à forma de garantir - em termos práticos - que um texto é articulado e coeso.
Não dispensa o regresso à gramática e aos exercícios.


Coesão textual

Dizemos que um texto é coeso se as suas diferentes partes constitutivas estão articuladas e interligadas, garantindo a sua unidade semântica.

A coesão textual pode ser assegurada através dos vários mecanismos linguísticos:
— cadeias de referência;
— repetições;
— substituições lexicais;
— conectores interfrásicos;
— compatibilidade entre informações de tempo e de aspeto.

Cadeias de referência
Estamos perante uma cadeia de referência quando, num texto, há um ou vários elementos textuais sem referência autónoma. A sua interpretação está, obrigatoriamente, dependente de outra expressão presente no texto.
1) Amava, amava as mulheres com sensualidade, estima e ternura. Sinceramente me julgava, perante elas, um sensual, um sentimental e um idealista. Decerto me não tinham inspirado grande ternura ou respeito as que até então fisicamente amara. Mas até essas, não pudera amar (amar da maneira que qualifiquei) sem uma ponta de afectividade (...). (J. Régio, O Vestido Cor de Fogo)*
A expressão nominal as mulheres e os pronomes elas, as e essas formam uma cadeia de referência, uma vez que o referente dos pronomes é o mesmo do da expressão nominal. Todas as expressões reenviam para a mesma entidade extralinguística.**
Podem integrar as cadeias de referência:
  • as anáforas
  • as catáforas
  • as elipses
  • a co-referência não anafórica.
Anáfora: expressão cuja interpretação depende de uma outra expressão presente no contexto verbal anterior.
(2) Ao longe, no alto mar, há ainda o exercício da pesca. Há lá homens. Não os vejo. (V. Ferreira, Até ao Fim)



O pronome pessoal oblíquo os remete para uma expressão referida anteriormente no discurso (homens), sendo, por isso, uma anáfora.
Catáfora: expressão cuja interpretação depende de outra presente no contexto verbal que vem imediatamente depois.
3) Com o meu irmão tudo foi diferente, sabe, as mulheres preferem-nos, aos filhos. (A. P. Inácio, Os Invisíveis)



O pronome pessoal os (nos) remete para uma expressão que aparece posteriormente no discurso (os filhos), sendo, por isso, uma catáfora.
Elipse: omissão de uma expressão recuperável pelo contexto, evitando assim a sua repetição.



Co-referência não anafórica: existe co-referência não anafórica quando duas ou mais expressões linguísticas remetem para o mesmo referente, não havendo dependência referencial de uma em relação a outra(s).
Coesão lexical
A coesão lexical pode ser realizada através de:
Repetição
Substituição lexical: para evitar repetições desnecessárias, pode substituir-se uma unidade lexical por outras que com ela mantenham relações semânticas de sinonímia, antonímia, hiponímia e hipernonímia.



Coesão interfrásica
A coesão de um texto depende da interdependência semântica entre as frases que o constituem, podendo ser assegurada através de diferentes tipos de conectores.
Desempenham a função de conectores palavras ou expressões que asseguram a ligação significativa entre frases/orações ou partes do texto, especificando o tipo de conexão existente (causa, tempo, contraste...). Assim, estes elementos são pistas linguísticas que guiam a interpretação do leitor ou ouvinte.
Podem funcionar como conectores:
— conjunções e locuções coordenativas e subordinativas (porque, no entanto...);
— advérbios conectivos (agora, assim, depois...);
— adjectivos (bom...);
— verbos (quer dizer...);
— grupos preposicionais/locuções adverbiais (pelo contrário, do mesmo modo...);
— orações (para concluir, pelo que referi anteriormente...).
* * Exemplos recolhidos no sítio «Apoio a Português», http://apoioptg.blogspot.pt/2007/04/coeso-textual.html, consultado em 3 de maio de 2012