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24 abril 2024

Noções básicas de versificação

 Noções básicas de versificação

É uma matéria antiga, mas mais vale rever. Aqui fica a informação.

 Dá para comandar seus sonhos: entenda o sonho lúcido e como ...

22 abril 2024

25 de abril - «Viva a Liberdade!», sessão com as famílias

Projeto «Viva a Liberdade! - o antes e o depois do 25 de abril no pensamento, na condição física e na saúde física e mental dos portugueses» 

- 19 de abril - sessão pública de apresentação de trabalhos interdisciplinares realizados em colaboração com as famílias dos alunos das turmas 12º A, B e D da Escola Secundária Henriques Nogueira -

Cartazes de divulgação e de recolha de registos; poema criado por um avô para a sessão pública

50 cravos de abril



Cartaz da sessão e lembrança para os participantes (criação dos alunos das turmas 12ºB e 12ºA, respetivamente)


Delegadas das turmas A, B e D, responsáveis pelas comunicações 
de abertura e de encerramento dos trabalhos


Alunos das três turmas apresentaram uma seleção de trabalhos realizados 
em Português, Biologia, Física e Educação Física

Painel de oradores convidados a dar testemunho da sua experiência associada ao 25 de abril - o investigador Venerando Matos, Carlos Ferreira, integrante da coluna de Salgueiro Maia, e os familiares de alunos - António Pinheiro, então jovem em serviço militar, e Mateus Pereira, à data emigrante no Canadá. 


Delegadas de Turma encerram os trabalhos.


O nosso auditório, constituído por alunos, pais e avós e outros membros da comunidade escolar



Exposição de trabalhos das três turmas, em vários suportes, incluindo áudios e vídeos com os testemunhos dos avós e outros familiares.  







18 abril 2024

Poetas contemporâneos e os seus leitores

Começamos hoje  a publicar os poemas selecionados pelos vários pares e as respetivas propostas de leitura. Estas publicações alargam e substituem a informação dispersa em vários comentários. Os contributos são publicados a par dos textos, de acordo com a autoria do trabalho.

Abaixo el-rei Sebastião
(Poema no Manual) 
É preciso enterrar el-rei Sebastião
é preciso dizer a toda a gente
que o Desejado já não pode vir.
É preciso quebrar na ideia e na canção
a guitarra fantástica e doente
que alguém trouxe de Alcácer Quibir.

Eu digo que está morto.
Deixai em paz el-rei Sebastião
deixai-o no desastre e na loucura.
Sem precisarmos de sair o porto
temos aqui à mão
a terra da aventura.

Vós que trazeis por dentro
de cada gesto
uma cansada humilhação
deixai falar na vossa voz a voz do vento
cantai em tom de grito e de protesto
matai dentro de vós el-rei Sebastião.

Quem vai tocar a rebate
os sinos de Portugal?
Poeta: é tempo de um punhal
por dentro da canção.
Que é preciso bater em quem nos bate
é preciso enterrar el-rei Sebastião.

                                                           Manuel Alegre
Manuel Alegre retrata o mito Sebastianista, ou seja como algo que se alojou no pensamento nacional como uma erva daninha que nos impossibilita de mudar e agir.
El-rei Sebastião simboliza, neste poema, o sonho e a loucura como na Mensagem, mas também a espera interminável da mudança, sendo então associada a uma dupla adjetivação: «a guitarra fantástica e doente / que alguém trouxe de Alcácer Quibir», esta guitarra que trouxeram de África «dá-nos música» e cria-nos uma ilusão fantástica e doente porque nos consome e não nos deixa atuar. No poema existe uma anáfora: «é preciso enterrar…/ é preciso dizer…/ é preciso quebrar/ é preciso bater…/ é preciso enterrar» que mostra a urgência da mudança, como algo indispensável.
D. Sebastião «está morto» e enterrado no passado: «Deixai em paz el-rei Sebastião»; devemos deixar de ficar focados no passado, pois o mesmo impossibilita-nos de viver o futuro, tema também retratado na peça Frei Luís de Sousa de Almeida Garrett. D. Madalena é o espelho desta situação, vivendo focada em D. João de Portugal, seu passado, não vivendo o seu presente e o seu futuro como poderia viver.
Manuel Alegre critica a sua sociedade repressiva dos anos 60 através do poema, encorajando-a a deixar D. Sebastião no passado e mudar, fazer com que «na nossa voz a voz do vento» soe ou, seja que tenha mais força a mudança do que os mitos e ideias fantásticas, tornando a vida mais real.
Para Manuel Alegre os poetas devem impulsionar esta ideia, são aqueles que devem colocar «um punhal dentro da canção», têm o dever de impelir esta mudança enfrentando medos.
Em suma, num tempo de inatividade, de sonhos impossíveis onde não há revolta, Manuel Alegre esperançoso, acredita que ainda vamos a tempo de mudar. A poesia tem esse papel, o de abrir os olhos à sociedade para a fazer mudar.

Aos Poetas

Somos nós
As humanas cigarras.
Nós,
Desde o tempo de Esopo conhecidos...
Nós,
Preguiçosos insectos perseguidos.

Somos nós os ridículos comparsas
Da fábula burguesa da formiga.
Nós, a tribo faminta de ciganos
Que se abriga
Ao luar.
Nós, que nunca passamos,
A passar...

Somos nós, e só nós podemos ter
Asas sonoras.
Asas que em certas horas
Palpitam.
Asas que morrem, mas que ressuscitam
Da sepultura.
E que da planura
Da seara
Erguem a um campo de maior altura
A mão que só altura semeara.

Por isso a vós, Poetas, eu levanto
A taça fraternal deste meu canto,
E bebo em vossa honra o doce vinho
Da amizade e da paz.
Vinho que não é meu,
Mas sim do mosto que a beleza traz.

E vos digo e conjuro que canteis.
Que sejais menestréis
Duma gesta de amor universal.
Duma epopeia que não tenha reis,
Mas homens de tamanho natural.

Homens de toda a terra sem fronteiras.
De todos os feitios e maneiras,
Da cor que o sol lhes deu à flor da pele.
Crias de Adão e Eva verdadeiras.
Homens da torre de Babel.

Homens do dia-a-dia
Que levantem paredes de ilusão.
Homens de pés no chão,
Que se calcem de sonho e de poesia
Pela graça infantil da vossa mão.

                                                                     Miguel Torga, in 'Odes'
Aos poetas
Miguel Torga no poema «Aos Poetas» faz uma alusão à Fábula da cigarra e da Formiga de Esopo, escritor da Grécia Antiga, do século VI a.C., comparando os poetas às cigarras. À imagem delas os poetas são aqueles que têm o dever de cantar para a sociedade, tornando-a mais bela. A referência à cultura cigana remete-nos para uma ideia de mudança, para os que não se deixam ficar no mesmo sítio pois o povo cigano é nómada.
Segundo Miguel Torga, são os poetas que têm «asas sonoras», que têm o dever de cantar sobre a amizade, a paz e o amor universal, «de todos os feitios e maneiras», pois somos todos «Crias de Adão e Eva» e «Homens da torre de Babel», ou seja de todas as línguas e culturas, independentemente «Da cor que o sol lhes deu à flor da pele». O sujeito poético expressa a sua opinião acerca da natureza da poesia e do ofício de poeta: «Somos nós …» os poetas quem tem esse dever - o de realçar a nossa comum humanidade, a fraternidade universal. 

Emprego e desemprego do poeta 
 Deixai que em suas mãos cresça o poema
como o som do avião no céu sem nuvens
ou no surdo verão as manhãs de domingo
Não lhe digais que é mão-de-obra a mais
que o tempo não está para a poesia

Publicar versos em jornais que tiram milhares
talvez até alguns milhões de exemplares
haverá coisa que se lhe compare?
Grandes mulheres como semiramis
públia hortênsia de castro ou vitória colonna
todas aquelas que mais íntimo morreram
não fizeram tanto por se imortalizar

Oh que agradável não é ver um poeta em exercício
chegar mesmo a fazer versos a pedido
versos que ao lê-los o mais arguto crítico em vão procuraria
quem evitasse a guerra maiúsculas-minúsculas melhor
Bem mais do que a harmonia entre os irmãos
o poeta em exercício é como azeite precioso derramado
na cabeça e na barba de aarão (1)

Chorai profissionais da caridade
pelo pobre poeta aposentado
que já nem sabe onde ir buscar os versos
Abandonado pela poesia
oh como são compridos para ele os dias
nem mesmo sabe aonde pôr as mãos

Ruy Belo, in "Aquele Grande Rio Eufrates"

(1) figura bíblica, comum às três grandes religiões; irmão de Moisés.

Emprego e desemprego do poeta
No poema de Ruy Belo, existe uma crítica a algum tipo de poetas. Segundo o sujeito, o poeta deve deixar crescer o poema, e não se desculpar para não o fazer, uma vez que a poesia está em tudo o que vemos. O poeta deve escrever pelo amor ao seu ofício, não para «Publicar versos em jornais que tiram milhares» ou «chegar mesmo a fazer versos a pedido».
Ruy Belo faz uso de nomes de várias poetisas importantes da Antiguidade ao século XVI (casos da humanista portuguesa Públia Hortênsia de Castro ou da italiana Vittoria Colonna) as quais escreviam pelo gosto de o fazer sendo conhecidas por isso mesmo, instigando os poetas modernos a segui-las enquanto modelo. Existe uma comparação no poema: «o poeta em exercício é como azeite precioso derramado/ na cabeça e na barba de aarão», enaltecendo o poeta, dizendo que o mesmo tem o dom e foi escolhido para a poesia (no Salmo 133,  David apresenta  a cena da unção do sacerdote Arão. O óleo “precioso” para ungir conhecido como “o óleo da santa unção” é derramado na sua cabeça e desce-lhe pelas barbas até às vestes).

17 abril 2024

Poetas contemporâneos - leituras (Eugénio de A. e Ruy Belo)

 Ruy Belo (1933-1978)
Nascido em Rio Maior, foi um poeta e ensaísta português. Estudou Direito em Coimbra e em Lisboa, tendo ido para Roma logo de seguida, onde tirou um doutoramento em Direito Canónico. Foi diretor literário da Editorial Aster, chefe de redação da revista Rumo e exerceu um cargo de diretor-adjunto no Ministério da Educação Nacional. Escreveu sobre a religião e a metafísica, sob a forma de interrogações acerca da existência, como em Boca Bilingue (1966), Homem de Palavra (s) (1969) e País possível (1973). Nos seus poemas conjugam-se domínios das técnicas poéticas tradicionais. A sua obra Obra poética de Ruy Belo (1981) é considerada uma das obras cimeiras da poesia portuguesa contemporânea.




Soneto Superdesenvolvido
É tão suave ter bons sentimentos,
consola tanto a alma de quem os tem,
que as boas acções são inesquecíveis momentos
e é um prazer fazer o bem.


Por isso, quando no Verão se chega a uma esplanada
sabe melhor dar esmola que beber a laranjada,
consola mais viver entre os muito pobres
que conviver com gente a quem não falta nada.


E ao fim de tantos anos a dar do que é seu,
independentemente da maneira como se alcançou,
ainda por cima se tem lugar garantido no céu,
gozo acrescido ao muito que se gozou.


Teria este ... se não tivesse outro sentido,
ser natural de um país subdesenvolvido.
                                                         Ruy Belo

Constituído por 3 quadras e um dístico, este poema insere-se na obra intitulada  País Possível (1973) que tem como tema principal a vida num Portugal opressivo, anterior à Revolução de Abril. É abordado como um país real onde são destacados os seus princípios e figuras principais, convidando a uma reflexão sobre o Portugal futuro, a uma outra alternativa de país.
Neste poema, o autor ironiza a atitude de caridade por parte das classes sociais mais altas e de resignação por parte dos pobres pois não há lugar nem voz para estes: servem apenas como um meio pela qual os mais ricos podem realizar boas ações e garantirem a sua satisfação pessoal. Ou seja, através do humor, são desvendadas as verdadeiras intenções da caridade das pessoas: para além de garantir consolo pessoal, abre também caminho para a aquisição de benefícios numa outra vida pois “independentemente da maneira como se alcançou,/ ainda por cima se tem lugar garantido no céu,/ gozo acrescido ao muito que se gozou.” Afinal de contas, tudo isto é “natural de um país subdesenvolvido”.


Eugénio de Andrade (1923-2005)
José Fontinhas, nascido no Fundão, frequentou o Liceu Passos Manuel, em Lisboa, tendo escrito os seus primeiros poemas com apenas 13 anos de idade e publicado o seu primeiro livro em 1940, Narciso. Completou o seu serviço militar em Coimbra e, posteriormente, regressou a Lisboa e tornou-se Inspetor Administrativo do Ministério da Saúde. Travou diversas amizades com personalidades portuguesas e estrangeiras como Miguel Torga, Sophia de Mello Breyner Andersen e Marguerite Yourcenar. Ganhou inúmeros prémios nacionais e internacionais, entre eles o Prémio Camões, em 2001. Algumas das suas obras são As mãos e os frutos (1948), Os amantes sem dinheiro (1950), Branco no branco (1984), Ofício de paciência (1994) e O sal da língua (1995). 
No dizer do poeta e crítico Pedro Mexia, é "Um poeta que entendeu a poesia como um instrumento da alegria."








   

Poema à mãe

 No mais fundo de ti,
eu sei que traí, mãe

Tudo porque já não sou
o retrato adormecido
no fundo dos teus olhos.

Tudo porque tu ignoras
que há leitos onde o frio não se demora
e noites rumorosas de águas matinais.

Por isso, às vezes, as palavras que te digo
são duras, mãe,
e o nosso amor é infeliz.

Tudo porque perdi as rosas brancas
que apertava junto ao coração
no retrato da moldura.

Se soubesses como ainda amo as rosas,
talvez não enchesses as horas de pesadelos.

Mas tu esqueceste muita coisa;
esqueceste que as minhas pernas cresceram,
que todo o meu corpo cresceu,
e até o meu coração
ficou enorme, mãe!

Olha — queres ouvir-me? —
às vezes ainda sou o menino
que adormeceu nos teus olhos;

ainda aperto contra o coração
rosas tão brancas
como as que tens na moldura;

ainda oiço a tua voz:
          Era uma vez uma princesa
          no meio de um laranjal...


Mas — tu sabes — a noite é enorme,
e todo o meu corpo cresceu.
Eu saí da moldura,
dei às aves os meus olhos a beber,

Não me esqueci de nada, mãe.
Guardo a tua voz dentro de mim.
E deixo-te as rosas.

Boa noite. Eu vou com as aves.

Eugénio de Andrade, in "Os Amantes Sem Dinheiro"

Leitura 1. (Luana e Márcia) 
Este poema, inserido na obra Os amantes sem dinheiro (1950), aborda o tema da relação entre mãe e filho, numa idade já mais avançada deste, em que já não é a criança a que a mãe estava habituada e, agora, restam apenas as recordações daquilo por que passaram, guardadas na memória de cada um. São-nos apresentadas perspetivas do presente e do passado: no passado, era uma criança feliz, onde o amor que recebia era exclusivo; ao contrário do presente, em que  é um jovem adulto com necessidade de um outro amor.
O autor convida-nos a uma reflexão acerca da nossa evolução, revelando um sentimento de culpa apontado às causas do desencontro afetivo, que era inevitáveis, acabando o poema com uma despedida da figura materna, dizendo “Boa noite. Eu vou com as aves.” que representa a separação física e psicológica da sua infância. 

Leitura 2. (Nuno e Tiago)
Há uma relação entre mãe e filho que foi traída pelo crescimento do último bem como pela sua vontade de descobrir o mundo para além dos seus horizontes. A mãe quer que este não se vá; porém, o filho, que pode ser interpretado como o próprio Eugénio de Andrade devido à semelhança entre poeta e sujeito poético, decide ir-se embora com as memórias do passado e o amor à sua progenitora.


Alexandre O’Neill (1924-1986)
Nascido em Lisboa, foi um poeta do movimento surrealista português, tendo publicado os seus primeiros poemas com apenas 17 anos mas só foi reconhecido como poeta em 1958 com a publicação No reino da Dinamarca. Para além de poesia, dedicou-se também a prosa, traduções e publicidade. Os seus textos têm como característica uma grande sátira a Portugal e aos portugueses. Trabalhou ainda temas como a solidão, o amor, o sonho e a passagem do tempo. Possui obras como Poemas com endereço (1962), As andorinhas não têm restaurante (1970), Entre a cortina e a vidraça (1972) e Uma coisa em forma de assim (1980).

Seis poemas confiados à memória de Nora Mitrani
                                         Nora Mitrani - A Paixão Ardente.  Fotógrafo:Fernando Lemos, 1949
V
Eu estava bom p’ra morrer
nesse dia.
Não tinha fome nem sede,
nem alarme ou agonia.

Eu estava tal como está
esse que perdeu a amiga,
o homem que sofreu já
tanto (nem se imagina!)

que ficou bem atestado
de fadiga
e copiou-se em alegre,
mas de uma torpe alegria,

que não era mesmo alegre,
mas alegre se fingia
só para enganar o morto
que dentro de si trazia.

Este é um modo de dizer
em que ninguém acredita,
mas não sei melhor dizer:
era assim que eu me sentia!

A solidão o que era?
O amor o que seria?
Já ninguém à minha espera,
para nenhures é que eu ia.

Eu estava bom p’ra morrer
— e ainda hoje morria…
Assim me quisesses dar
e tirar — só tu! — a vida.
                                           Alexandre O’Neill

Este poema encontra-se na obra Poemas com endereço (1962) e faz parte de um conjunto de poemas que o autor escreveu dedicados a Nora Mitrani, uma grande paixão sua, que se suicidou em 1961, deixando O’Neill com um grande desgosto. 
O sujeito poético diz-nos que estava pronto para morrer com a sua amada mas que a vida assim não o quis e que continua cá, fingindo ser feliz  - "não era mesmo alegre/mas alegre se fingia" - quando, no fundo, já ele próprio está morto:"o morto que dentro de si trazia". Mostra-nos um sofrimento profundo de alguém que acabou de perder uma pessoa bastante chegada a si e que agora se encontra sozinho, “Já ninguém à minha espera”.

Luana e Márcia

16 abril 2024

Poetas contemporâneos - leituras

Bibliografia Manuel Alegre:
Nasceu a 12 de maio de 1936 em Águeda. Estudou direito na Universidade de Coimbra. Em 1963 foi preso pela PIDE e um ano depois exilou-se em Paris, só voltando a Portugal depois do 25 de abril. Mais recentemente, em 2005, candidatou-se à presidência da república tendo sido o segundo candidato mais votado. Paralelamente com a sua vida política, Manuel Alegre, escreveu diversos poemas como a “Praça da Canção” e o “Auto de António”. Escreveu também, alguns livros tanto de ficção como de literatura infantil.

Bibliografia Ruy Belo:
Nasceu a 27 de fevereiro de 1933 em Rio Maior. Eatudou direito na Universidade de Coimbra e depois na de Lisboa. Foi considerado um dos mais conseituados poetas portugueses da segunda metade do século XX. Foi professor universitário em Madrid e professor na Escola Secundária Ferreira Dias. Escreveu, durante a sua vida, diversos poemas como “Aquele grande rio Eufrates” e “E tudo era possível”. Morreu em Queluz no dia 8 de agosto de 1978.

Bibliografia Alexandre O'Neill:
Nasceu em Lisboa a 19 de dezembro de 1924 e foi um dos poetas fundadores do movimento surrealista português, foi preso diversas vezes pela PIDE. Publicou poesia mas também prosa e traduções. Escreveu o slogan “Há mar e mar, há ir e voltar”. O poeta português só foi reconhecido como tal em 1958. Escreveu “Há palavras que nos beijam” e “Feira cabisbaixa”. Morreu em Lisboa a 21 de agosto de 1986.
***
“E tudo era possível” 
Na minha juventude antes de ter saído
da casa de meus pais disposto a viajar
eu conhecia já o rebentar do mar
das páginas dos livros que já tinha lido

Chegava o mês de maio era tudo florido
o rolo das manhãs punha-se a circular
e era só ouvir o sonhador falar
da vida como se ela houvesse acontecido

E tudo se passava numa outra vida
e havia para as coisas sempre uma saída
Quando foi isso? Eu próprio não o sei dizer

Só sei que tinha o poder duma criança
entre as coisas e mim havia vizinhança
e tudo era possível era só querer

                                                              Ruy Belo, Homem de Palavra[s]
                  
Leitura 1. (Afonso e Alexandra)
O grande tema é o sonho e como ele pode ser o “motor” da vida. O sujeito poético reflete sobre a sua infância e juventude, mostrando uma grande vontade de regressar a esses tempos. Apresenta-se a dicotomia “antes” e “agora”. O “antes” corresponde à idade da infância caracterizada pela despreocupação. O “agora” corresponde à idade adulta.

Leitura 2. (B.Bento e B. Lucas)
Neste poema, Ruy Belo faz referência a um tempo de sonho, esperança, alegria e inocência reforçando o poder da imaginação e da inconsciência na construção de uma ideia de mundo.
Contudo, o poeta caracteriza a juventude como uma fase alheia a uma realidade, sem responsabilidades nem preocupações. Este poema reproduz no leitor um sentimento de nostalgia relativamente às lembranças da juventude.
Assim, este poema remete-nos para um confronto entre o nosso tempo de infância e a realidade adulta, em que se intensifica a dificuldade da tomada de decisões.
“Letra para um hino”
É possível falar sem um nó na garganta
É possível amar sem que venham proibir
É possível correr sem que seja a fugir.
Se tens vontade de cantar não tenhas medo: canta.

É possível andar sem olhar para o chão
É possível viver sem que seja de rastos.
Os teus olhos nasceram para olhar os astros.
Se te apetecer dizer não grita comigo: Não.

É possível viver de outro modo.
É possível transformares em arma a tua mão.
É possível o amor. É possível o pão.
É possível viver de pé.

Não te deixes murchar. Não deixes que te domem.
É possível viver sem fingir que se vive.
É possível ser homem.
É possível ser livre livre livre.

                                                      Manuel Alegre 

Leitura 1.
O poema é uma exortação à ação de modo a atingir a liberdade. A grande mensagem está presente no vocábulo “hino”. Este representa um apelo à ação para a libertação da vida vivida com a finalidade de alcançar a vida sonhada/possível. Neste poema está presente uma relação de oposição entre a “terra” - «olhar para o chão» e o “céu” - «Os teus olhos nasceram para olhar os astros». A “terra” ilustra a vida submissa e sem ânimo. O “céu” representa a vida sonhada/idealizada, a que todos os homens têm direito. (Afonso e Alexandra)

 Leitura 2.
O poema “Letra para um hino” (página 212 do Manual) é um hino à sociedade livre, uma crítica à ditadura e uma demonstração de honra, coragem e olhar destemido em relação ao mundo. Foi escrito em 1967, em pleno regime ditatorial. Sendo o “hino” uma composição poética em honra da nação, o próprio título do poema dá a ideia que os versos de Manuel Alegre deveriam ser os ideais da nação, ao contrário dos ideais que a ditadura impõe. (Diana e Daniel)

 O poema assenta na anáfora (repetida doze vezes) - «É possível», essencial à compreensão da mensagem essencial - a de que a liberdade e a esperança não eram impossíveis em Portugal, a de que é necessário e «possível» insurgir.-se, dizer «não» - "Se te apetecer dizer não grita comigo: Não.".
A sociedade repressiva e autoritária existente no país é caracterizada pela evocação da falta de liberdade de expressão - «com um nó na garganta», «amar sem que venham proibir», «viver sem que seja de rastos», a pobreza e a subserviência - «o pão», «murchar», «domem». 
Para o poeta a condição de homem - «ser homem» - é indissociável da liberdade, pelo que o poema finaliza com a tripla repetição do adjetivo - «livre, livre, livre».

“Há palavras que nos beijam” 
Há palavras que nos beijam
Como se tivessem boca.
Palavras de amor, de esperança,
De imenso amor, de esperança louca.

Palavras nuas que beijas
Quando a noite perde o rosto;
Palavras que se recusam
Aos muros do teu desgosto.

De repente coloridas
Entre palavras sem cor,
Esperadas inesperadas
Como a poesia ou o amor.

(O nome de quem se ama
Letra a letra revelado
No mármore distraído
No papel abandonado)

Palavras que nos transportam
Aonde a noite é mais forte,
Ao silêncio dos amantes
Abraçados contra a morte.

Alexandre O'Neill, in 'No Reino da Dinamarca'
“Há palavras que nos beijam”

Este poema revela a capacidade que as palavras têm de despertar em nós diversos sentimentos como o amor e a esperança, apenas pelo simples facto de serem mencionadas, ouvidas ou pensadas. As palavras são símbolo de coragem, força e determinação. Estas podem dar-nos esperança bem como cor para a vida. O próprio título do poema é  uma personificação, em que as palavras surgem como se tivessem boca e nos pudessem beijar, dando ainda mais força emocional ao poder que estas têm.
(a completar)
Afonso e Alexandra

Poetas Contemporâneos (cont.)
















Definição (Nuno Júdice)

Quem esquece o amor, e o dissipa, saberá
que sentimento corrompe, ou apenas se o coração
se encontra no vazio da memória? O vento
não percorre a tarde com o seu canto alucinado,
que só os loucos pressentem, para que tu
o ignores; nem a sabedoria melancólica das árvores
te oferece uma sombra para que lhe
fujas com um riso ágil de quem crê
na superfície da vida. Esses são alguns limites
que a natureza põe a quem resiste à convicção
da noite. O caminho está aberto, porém,
para quem se decida a reconhecê-los; e os próprios
passos encontram a direcção fácil nos sulcos
que o poema abriu na erva gasta da linguagem. Então,
entra nesse campo; não receies o horizonte
que a tempestade habita, à tarde, nem o vulto inquieto
cujos braços te chamam. Apropria-te do calor
seco dos vestíbulos. Bebe o licor
das conchas residuais do sexo. Assim, os teus lábios
imprimem nos meus uma marca de sangue, manchando
o verso. Ambos cedemos à promiscuidade do poente,
ignorando as nuvens e os astros. O amor
é esse contacto sem espaço,
o quarto fechado das sensações,
a respiração que a terra ouve
pelos ouvidos da treva.
                                                               Nuno Júdice, in "Um Canto na Espessura do Tempo"
 
Nuno Júdice pede que não se ignore nem se fuja do amor porque este está como a sombra, perto mas não para fugirmos dele.
O caminho está sempre livre mas temos que reconhecer que temos limites. Devemos deixar-nos ir pelos caminhos que se abrem naturalmente até ao amor.
O poeta reconhece os seus limites mas sabe que não os deve temer.
O sentimento provocado pelo amor faz com que os versos escritos pelo poeta fiquem marcados (manchados) por esse sentimento.
No final do poema podemos encontrar uma definição que, para Nuno Júdice, é a definição de amor.

Biografia
Nuno Júdice nasceu a 29 de abril de 1949, na Mexilhoeira Grande. Licenciou-se em filosofia românica na Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa. Foi professor do ensino secundário, diretor da revista "Tabacaria" (editada pela Casa Fernando Pessoa) e diretor do Instituto Camões em Paris. Foi também além de poeta, ensaísta e ficcionista.



Inocência (Miguel Torga)

Vou aqui como um anjo, e carregado

De crimes!
Com asas de poeta voa-se no céu...
De tudo me redimes,
Penitência
De ser artista!
Nada sei,
Nada valho,
Nada faço,
E abre-se em mim a força deste abraço
Que abarca o mundo!

Tudo amo, admiro e compreendo.
Sou como um sol fecundo
Que adoça e doira, tendo
Calor apenas.
Puro,
Divino
E humano como os outros meus irmãos,
Caminho nesta ingénua confiança
De criança
Que faz milagres a bater as mãos.

                                                                                       Miguel Torga, in 'Penas do Purgatório'  
Miguel Torga, mostra o sentimento que dá título a este poema através de várias palavras religiosas como "anjo", "céu" e "milagres".
Ao longo do poema, o poeta vai usando comparações para percebermos essa sua inocência, comparando-se a um anjo "carregado / De crimes!" e a uma criança que é ingénua.
Com a expressão "abraço / Que abarca o mundo!", Miguel Torga mostra que o sentimento de ingenuidade não se aplica só a si mas a todo o mundo.
O uso da anáfora "Nada" também mostra que o poeta acha que nada sabe mas esta figura de estilo é depois contrastada com "Tudo" o que ele ama, admira e compreende.

Biografia
Miguel Torga nasceu a 12 de agosto de 1907, em Vila Real. Miguel Torga era pseudónimo para Adolfo Correia da Rocha. Foi para o Brasil com 13 anos, antes de ir para a Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra. Além de poeta foi também contista, dramaturgo e médico.
Morreu a 17 de janeiro de 1995 em Coimbra de cancro.



O Silêncio (Eugénio de Andrade)
 Quando a ternura
parece já do seu ofício fatigada,

e o sono, a mais incerta barca,
inda demora,

quando azuis irrompem
os teus olhos

e procuram
nos meus navegação segura,

é que eu te falo das palavras
desamparadas e desertas,

pelo silêncio fascinadas.

Eugénio de Andrade, in "Obscuro Domínio"

 
O poema retrata o poder do silêncio e o que é possível "dizer" e transmitir sem entoar palavra alguma. O uso de vírgulas contínuas dá a ideia da repetição e tranquilidade criada através do silêncio, à noite, quando «o sono, a mais incerta barca/inda demora».
O poema é marcado pelo uso da personificação: "ternura fatigada", "incerta barca" e "palavras desamparadas e desertas".

Biografia (Eugénio de Andrade)
O poeta nasceu a 19 de janeiro de 1923, no Fundão. Eugénio de Andrade é pseudónimo para José Fontinhas.
Tem uma biblioteca com o seu nome e além de poeta foi escritor e tradutor.
Morreu a 13 de junho de 2005, no Porto devido a uma doença neurológica prolongada.


Márcio Leopoldo, nº 16
Maria Nazaré, nº 17



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